domingo, 25 de março de 2012

calhante

conceitos claros na escuridão da palavra
gaivotas voam nos arredores
os urubus descansam
as letras decaem do papel

os quereres tocam os rádios
os amores fazem chover
sal nos olhos de quem não sabe
os predicados doem sem
são sentenças e curtas

sem conceitos há
os indecidíveis da anti-razão
(ou seria racional postulá-los)

um elefante canta na cabeça
das palavras em sua fase pós-lapsária
entre desnexos
encontram-se sons

o mar só pensa em seios
o eu despensa, desconversa
acostuma-se e deserta
há mar do mesmo jeito
a cada onda que deita

de deitar se vai ao sono
ao fim e ao cabo
são os dias, as horas
e as angústias que passam
para um doente na floresta
quando pousa na clareira

não se pode ser raposa
há mais vida para além da caça
objeto para seres cuja cultura
ainda é restrita à espera do advento da lógica

pensavam na areia que não fosse à pele
uma areia antiaderente
já não seria areia ou
não haveria gravidade
donde se conclui que
o peso das coisas
fazem as palavras pesarem nos livros
como se fossem coisas
ou o peso das palavras fazem
as coisas pesarem como nos livros

todavia entortam o poeta
para que ele escolha a linguagem
dite as regras do poema
escreva, descreva, remeta, cite,
plageie, roube ou nada diga de
ontologicamente novo

cansados da poesia
(porque ela não podia dizer nada
nem fazer nada
nem ser útil
nem dar alegria
nem comer um suspiro
tão pouco falar
tão pouco querer
tão pouco encontrar-se
tão pouco usar
tão pouco grafar)
os poetas decidiram em concílio
calarem-se
e já era a poesia do silêncio que diziam
- tagarelavam os críticos -

cansados da maresia
os pescadores foram buscar os peixes
e fizeram dos restos de conchas
um lugar para dormir nos calmos arrecifes

quando tudo era e
e mais alguma coisa
a neblina trazia a chuva
dormiam felizes, frescos
era simples
e não era de dizer
as palavras









Nenhum comentário:

Postar um comentário