quarta-feira, 25 de julho de 2012

Sobre Drummond

Nada digo, pois no silêncio ele me devora como as pedras que, em Minas, rolam, sofrem, ferem-se e se encontram amorosamente. Sobre ele, não há nada sobre ele que não seja o sempre, este sempre incalculável da imprevista simplicidade de um tapa do tempo em que ele, perdendo filhos, fez dos mistérios mais mistérios para que eles (os filhos e os mistérios) estivessem com ele, inteiros. Os filhos, a vida, a morte. O nada, propulsão de calor arredio de si, que apazigua o próprio ânimo de calor e escorre (humano) num papel com caneta. E eis tudo. Que saberei eu deste senhor chamado Drummond. Este sobrenome que soa caverna escura e abrigo? Quero ler Drummond para ver sua extrema infância da maturidade extrema e sentir que o fito de lê-lo é ainda tentar escrever sobre mim.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

dentro do meu peito, assim também

há uma beleza nas taturanas que parece brilho de peixe
ou um fio do seu cabelo no meu queixo que parece nada
tem umas coisas sobre esta mesa
e não me sacio fácil

pode ser saudade, pode ser ninguém

as borboletas hoje de tarde tinham muita certeza pr'aonde iam
eu cortei os cabelos e fiz a barba; eu também tenho certeza
de que não sou borboleta

como aquela faca que ele encostou no meu peito
brilhando como escamas bem prata, eu acho tudo muito cinza
toda nuvem de chuva a gente acha pesada, um pouco

o vermelho é que é algo difícil



Monocrônica


A cada dez minutos, toca o despertador que me avisa sobre as coisas urgentes do dia. A cada dez minutos, faço a coisa mais importante do dia. Passados mais dez minutos, as coisas do dia ainda estão por fazer, mas eu? Eu fiz a coisa mais importante do dia. E até aqui, a meia volta, metade do mundo precisava de tempo. Os próximos dez minutos, desde os últimos passaram-se. Os ponteiros deram a volta em mim. Passaram-se mais dez minutos. Somados, enfim, a todos os dez minutos, o que acabei fazendo foi hora.

cosedura inubíqua

Em vista dos últimos acontecimentos
é preciso declarar
que não há mais muito espaço
para acreditar em nada.
O vazio arenoso das
nadificações
faz desertar da vida
como quem nada dela quer.
Por isso, o uso de pontos.
Pontos suportam o mundo,
como o fazem os ombros.
Eles marcam as mudanças,
em linhas e curvas
que nos fazem gostar
um pouco mais
dos escombros disponíveis
aos sentimentos.
Não desacreditar de amar
para além da lamechisse automática
que a indústria empacota:
eis um experimento
entre nobres restos.
A pieguice dos dizeres
contaminaria os lábios
mudos que falam
na ponta dos dedos,
se os dedos não
desdenhassem da mão,
desenhando-a
a desenhar outra mão.
Incongruência e confusão.
Costura de trapos,
as palavras velhas
maltrapilham para refazer
o amor como sentença,
com pontos e vírgulas
desajeitadas,
aos tropeços de um ser
que vive como quem
nunca passa dos poemas
de adolescência.

sábado, 7 de julho de 2012

lip

I.
lipse
    lise
      elips
    pilspe
elisispe
elissipe
el
sissipe
elissipe
silissipe
selissipe
pelissepe
pele
pesse
pliese
pelisse
plesse
pilesse
pelesse
lipsesse:
sepssesse
ilipsesse
pilpes
pespe
pispe
lispe
sisse
pespe
sispe
pelse
pilse
pisse
pilp    sesse


il
sesse
il
sesse
lipsesse
il ne sesse
pes lips
il ne sesse
pes lips


II.
aelipsejá
esc'onde
c e o sol


III.
aelispsejá
o sol e você
escondem

esconda
umaelispsejá
qu'omar
aospassos
ttomba



IV.
pelos espaços
aelipsejá
escavara
umacova 


V.
cheiade
deslizeslá
aelipsejá
deixade
nãoquermais
demais
desfalar
prafalar
d’espique
esconde




VI.
sissisesse
lissi  lesse
pissi     pesse
lipsse   lepsse
pepsi
pipi
pipi
pepso
pique
pipse
pepe
pip        sili
pep    sile
slepe
slipe
solipe
esconde
sleep
on my
lips
slepe
on my
piesses
pesse
il pesse
il ne pesse
esconde
e o e
i o i
i on
lips
sleepin
on

l

Obscena você,
seduz com essas linhas e curvas,
sibilando nas minhas orelhas.
Sim, você, no ponto,
fingindo-se interrogada pelo meu
olhar?
Não me diga que quer
que eu te reinvente?
Fica impressionada,
cheia de exclamações obsessivas!
Quer ler meus pensamentos
quando parece que
sou eu que leio os teus.

E se eu te abandono
na esquina dos nossos flertes
e viro a página,
parece ficar ofendida
porque não te dei a devida
atenção.

Obscena você, sim.
Não abandona os meus
sentimentos líricos,
cedendo os acentos
para o mundo de coisas
elipsadas no por vir.
Cheia de metáforas,
desvia-se e,
impudente,
insiste em estar
na linha
pra que qualquer que seja,
o trem
passe e encerre
a nossa já
desgastada relação.

Mas reticente,
roubo o teu corpo
e te renovo na fonte,
à espera de que isso
nunca mais volte a acontecer.
Por fim,
mesmo ciente de minha redundância,
alitero: obscena você,
que nunca vai se mostrar,
assim,
peladinha pra mim.